Com quase 40 mil downloads registrados, o aplicativo
ABC Autismo auxilia muitos
crianças e adolescentes autistas com dificuldade no processo de aprendizagem. A
ferramenta desenvolvida por pesquisadores do Instituto Federal de Alagoas
(Ifal).
O aplicativo adota as premissas do
programa Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Déficits
relacionados com a Comunicação (Teacch), criado em 1964, na Universidade da
Carolina do Norte (EUA), por ele ser um programa mundialmente utilizado para
auxiliar no processo de alfabetização de crianças com o transtorno de
desenvolvimento.
Coordenadora do projeto que desenvolveu
o aplicativo, Mônica Ximenes explicou que a estrutura do ABC Autismo é baseada
em quatro níveis de dificuldade, assim como o programa Teacch. “Os dois
primeiros níveis são com habilidades concretas, mas como a gente não podia
transpor essas atividades concretas para um aplicativo, a gente pegou
atividades dos níveis 3 e 4 do Teacch e transformou em quatro níveis de
complexidade no aplicativo. ”
No jogo, nos dois primeiros níveis a
criança aprende habilidades como transposição e discriminação. A partir do
terceiro nível, as atividades ficam mais complexas, exigindo um maior
raciocínio por parte do usuário. O quarto e último nível do aplicativo, que
está de acordo com o quarto nível do Teacch, aborda a questão do letramento, no
qual é ensinado a repartição de sílabas, conhecimento de vogais e formação de
palavras.
Mônica relatou que o Teacch trabalha
com um ensino estruturado, com aprendizagem mediante sinalização visual.
“Quando a criança olha para a tarefa, a própria atividade já indica o que
precisa ser feito. Então, isso traz uma autonomia e uma independência para a
criança, porque ela não precisa de ajuda para entender a proposta da tarefa, o
que ajuda a evitar distrações. A porta de entrada de aprendizagem do autista é
visual, por isso ele precisa de estruturas de aprendizagem apoiadas no modelo visual.
”
O aplicativo foi testado na Associação
de Amigos Autistas de Alagoas e teve um bom resultado por causa da aceitação
dos jovens. Mônica diz que a validação científica será feita com a tese de
mestrado de um participante do projeto. “A ideia é verificar se a ferramenta
proporciona uma aceleração do aprendizado de algumas habilidades. ”
De acordo com a neuropediatra Carla
Gikovate, o aprendizado de português de crianças autistas é bem diferenciado,
porque há diferentes tipos de dificuldades para crianças autistas para aprender
português.
“Tem crianças que não alfabetizam
porque não conseguem prestar atenção nas letras, outras podem ter dificuldade
em memorizar o que aprenderam, outras podem ter dificuldades de grafismo ao
fazer a forma das letras. Cada tipo de dificuldade pressupõe uma intervenção diferente.
”
Heitor, de 3 anos, diagnosticado com
autismo em junho de 2014, é um dos usuários ativos do jogo. A mãe do menino,
Tatiane Regina da Paz, diz que o ABC Autismo ajudou o filho, por exemplo, a ter
coordenação para encaixar objetos. “Foi uma grande ajuda, tanto que serve para
ele desestressar, além de ser educativo. O aplicativo ajuda muito para prender
a atenção dele, ele ficar parado e concentrado por um período razoável. ”
Com grau de comprometimento
significativo de autismo, os gêmeos Gustavo e Cristiano, de 20 anos, que não
foram alfabetizados, dominam as fases apresentadas no jogo. Segundo a mãe,
Maria Helena de Azeredo Roscoe, devido à boa interface da ferramenta, os dois
conseguem abrir o game espontaneamente e jogá-lo com bastante autonomia.
“Para eles, utilizar o aplicativo é
prazeroso porque facilita a compreensão e eles acabam aprendendo coisas de uma
forma que, para eles, é mais fácil. O aplicativo desperta o interesse, facilita
o aprendizado, tudo com uma certa autonomia. ”
Maria Helena, que também é
diretora-técnica da Associação Brasileira de Autismo, disse que o aplicativo
precisaria ter outros níveis de dificuldade. “Para uma aprendizagem mais
sólida, eu acho que teria que ter mais conteúdo nesse mesmo formato do
aplicativo. Eu acho que tem chance de melhorar mais a aprendizagem de português
se forem introduzidos mais módulos no jogo, com graus de dificuldade maiores”,
avaliou.
O autismo é uma condição geral para um
grupo de desordens complexas do desenvolvimento do cérebro, antes, durante ou
logo após o nascimento. Esses distúrbios se caracterizam pela dificuldade na
comunicação social e comportamentos repetitivos. Embora todas as pessoas com
transtornos do espectro autista partilhem essas dificuldades, o seu estado irá
afetá-las com intensidades diferentes. Assim, essas diferenças podem existir
desde o nascimento e serem óbvias para todos; ou podem ser mais sutis e
tornarem-se mais visíveis ao longo do desenvolvimento.